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Se eu vos libertar...

  • Marcos Nicolini
  • Oct 3
  • 5 min read

Platão criou um mito, o da política a partir da racionalidade contemplativa, aproximando, assim, a pragmática política do mistério, da mística.


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Haveria aqueles que contemplando (esta palavra misteriosa que fala de um olhar para o mundo superior, no qual se pode descortinar a Verdade, a Justiça, o Bom e toda Beleza : o olhar do Logos, da Razão) a Ideia, a ordem das coisas como são em si mesmas, podem governar, fazer com que o mundo dos homens possa se ordenar de modo Justo, Bom, Belo e Verdadeiramente. Um Paraíso.


Uma Utopia! Um inexistente! Uma farsa!


Tomando tal falácia como fundamento para a ordem policial criaram Estados sob a tirania da Sabedoria Platônica.


Alguns indivíduos conhecedores destas Verdades, contempladores de lugares utópicos (não-lugares) são os legítimos condutores da humanidade.


São pois lograram ascender a este não-Lugar (nada mais misterioso que um lugar não-lugar) de excelência moral, política. A moral não mais advinda das relações sociais (entre indivíduos e grupos), mas do olhar do Filósofo-Rei.São homens-deuses que, por sua excelência, são reconhecidos como possuidores do direito de pastorear, conduzir os demais sub-humanos à ação civilizada.


São humanos superiores, como diria o discípulo de Platão, Nietzsche (apesar deste negar sua fidelidade à sobre-humanidade resultante da metafísica platônica). Ou como sugeririam os Espinozistas: conhecedores da Natureza, isto é, de Deus, ou seja, da Ordem conhecível em sua inexorabilidade, necessidade.


A apenas alguns a superioridade cognoscente.


Há humanos de 1a ordem (os que contemplam o Mundo como É), há humanos de 3a ordem (os que vivem presos aos apetites do espaço-tempo) e há os que fazem as Ideias se tornarem ordem social: os serviçais dos humanos de 1a ordem, que empunhando armas e canetas ressoam a Ideia montada a cavalo.


Este é o modelo que vemos como crença dos Progressistas, dos Marxistas, dos Fascistas, dos Nacionais-Socialistas, dos Hegelianos de Direita e de Esquerda, dos Utopistas, dos Intelectuais (como diria Benda, traidores), dos Kantianos, dos Comteanos, dos Nietzschinianos, etc.


Todos acreditam que haja algo superior (Ideia, Logos, Natureza, Ciência, Imperativo Categórico, Classe, Religião, etc) e nas hierarquias sociais que segregam os humanos entre classes de acordo com a capacidade de ser superior pela capacidade de contemplar por meio da Razão. A Religião Cristã, de Agostinho em diante, acredita que os humanos fazem parte da própria divindade; alguns se dão conta disto e se tornam humanos superiores, outros apenas pecadores, aqueles que erram o alvo e precisam ser tutelados.


O modelo de sociedade que querem trazer ao mundo humano é aquele em que alguns legislam (leger = o que pode ser lido), outros fazem cumprir e outros cumprem sem saber a Razão. A sociedade tutelar, já Freud disse isto.Há outra linhagem, outra humanidade possível, que olha para o humano e percebe nele um animalzinho angustiado, com potencialidades, mas desprovido de recursos divinos. Animais muito propensos ao egoísmo e violência, embora com alguma e rara propensão altruísta.


Animaizinhos que não descendem diretamente da divindade. Que ao contemplar apenas veem seus sentimentos, desejos e umbigo, por vezes fazem poesia e se curvam num gesto de bom-samaritanismo.


Este encontro do humano com sua humanidade, sua animalidade, seu estar num mundo que ao tentar fazer o bem, realiza o mal, ao tentar trazer a justiça produz injustiça, ao buscar a verdade encontra a dúvida, etc.


Desta constatação antropológica minimamente consciente nasceu o Liberalismo: a profunda desconfiança na possibilidade de que um ou poucos possam ter atributos que lhes permita ser os condutores da humanidade sem fazer com que suas posições narcisistas não imperem. Ou seja, que o império da Razão não seja nada além do que desejo sádico de psicopatas. Que o Logos não seja nada além do que interesses umbilicais disfarçados de bem comum.


O Liberal é alguém que percebeu a falácia sofismática das armadilhas dos Intelectuais. A fim de tentar contrapor-se a eles, os Liberais procuraram rachar o poder. Quebram os grilhões dos tiranos. Coloca em lugares diferentes os contempladores das verdades e suas utopias brutais e assassinas.Num lugar os sádicos parasitas sociais chamados de Políticos; de outros os tiranos chamados de juristas; noutro espaço os desumanizados insensíveis chamados de empresários; de outros os lunáticos chamados de intelectuais; mais ainda os torturadores chamados de cientistas; de outros os entorpecidos em cotidiano chamados de trabalhadores; em um canto escuro os poetas e artistas fugidores do real; sob o resto do véu rasgado os religiosos, etc.


Assim, encontrando lugar aos bichos os limitou em seus poderes e criou co-dependência. Co-dependentes precisam cooperar e limitarem-se em suas potências e contribuir, cada qual, com a possibilidade de uma vida comum e que a partilha seja mais decente.

O Liberal vai além do Além-do-Homem, estando exatamente no Aqui-do-Humano. Não estamos ligados a Deus por meio de uma Alma do Mundo, nem podemos contemplar a Ideia, ou ainda ascender à Razão, ou conhecer a Natureza, nem mesmo estar acima e além deste tempo e deste espaço.


Abrir parêntesis. Escrevi isto e li. Sorrindo pensei: “como posso eu escrever isto se sou alguém que creio em Deus e em Seu Filho Jesus Cristo, o Deus encarnado?”. Não me estenderei, mas posso dizer: “exatamente por ser um liberal que posso crer, ter fé no Unigênito do Pai (como disse João) e como fala Paulo, “Ele é a imagem do Deus invisível”. De minha parte olho-me e vejo apenas um humano que crê, que ama e que espera. Fechar parêntesis.


Mas somos humanos com forte dose de egoísmo, olhando sempre para nossas demandas mais mesquinhas. Aqui e ali podemos imitar gestos filantrópicos e altruístas, auxiliando os desconhecidos enquanto cuidamos dos que as faces nos são amistosas e cotidianas.


Agiremos motivados por desejos individuais, egoístas, grupais, comprometidos com o bando e repletos de medo, o qual se manifesta em violência e agressão contra os diferentes.


Contudo não somos animais violentos, também podemos ter gestos de amizade, companheirismo, hospitalidade, se e quando nos defrontamos com o movimento amoroso de quem nos serve de exemplo a ser imitado.


Enfim, o Liberal não é naïve, como os Crentes na Razão!

Por abandonar esta ingenuidade fantasmagórica, fragmentam o poder e cria, artificialmente a co-dependência horizontal.


A ética Liberal parte de um pressuposto, a meu ver, insofismável: a igualdade é anti-ética, apenas a diferença está aberta à busca do encontro e da busca de co-vivência. Todos os demais modelos, contemplativos, ao serem monistas são a-éticos, exigindo a eliminação do outro a fim de produzir uma sociedade hierárquica e movida por um princípio de dependência vertical.


Para apontar para um sumário sem concluir ou fechar a questão, podemos dizer: o que enfrentamos hoje é um esforço descomunal de forças monistas, violentas, truculentas, sádicas, a-éticas, tirânicas, etc., que, pretensamente fundadas na Razão, no Conhecimento, na Ciência, na Verdade, visam destruir, eliminar, extinguir, solapar qualquer possibilidade de questionar tal Mentira e, assim, fundar um Estado Sádico de imposição de legalidade da qual eles mesmos estarão isentos.


Os deuses estão saindo do Inferno e seus Cavaleiros (fome, guerra, peste e monismo) já se aplicam na expansão do deserto. “Só um Deus ainda pode nos salvar.”

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