Vale da decisão: entre a liberdade e a extinção
- Marcos Nicolini
- Jan 15, 2023
- 2 min read
A ontologia do trabalho: o trabalho, em Hegel, é o negativo que se antepõe ao conceito da técnica, a positividade.

Lembrando Heidegger, sem acompanhá-lo, talvez, até ao fim, perguntaríamos: qual a essência da técnica? A técnica é o esforço humano que busca responder à carência humana e ao desejo humano ao acesso ao disponível. A técnica é prótese e suplemento, mas, é dispositivação que faz o humano ir e realizar o que seu corpo não obteria êxito. Mas, a cada avanço da técnica há um retrocesso do corpo, pois que os dispositivos técnicos, as próteses e os suplementos, realizam o que demandava esforço humano.
Assim, no encontro entre o conceito técnico positivo e o trabalho como negativo, dá-se o dispositivo (suplemento e próteses) que anulam o trabalho, assim como não realizam plenamente a técnica. Nisto consiste a essência da engenharia, atualizar o conceito da técnica, mas agora diante deste imbricamento trabalho humano e dispositivação técnica, visando superar esta relação anulando a carência e encontrando o desejo humano: acesso pleno e perfeito ao disponível.
Neste ponto entra outro ingrediente obliterado, mas que emerge a cada round desta dialética técnica-trabalho: o encontro do positivo (o desejo humano ilimitado) com o negativo (os recursos limitados). Esta é a falácia nos modelos pós-hegelianos: à esquerda o marxismo com a ideia que o comunismo se realiza logo após a plena realização do capitalismo e à direita a sociedade de consumo, a cibernética e a I.A. Esta escatologia de um mundo sem carência, isto é, aquele em que cada desejo encontra um disponível, é não apenas uma mentira, como, ainda mais, um projeto armagedônico onde o deserto nadifica mundo.
No fundo, então, o que desaparece não é a dialética técnica-dispositivo que confronta uma carência ou deficiência, mas o que desaparece é o humano como lugar do trabalho, isto é, o dispositivo que realiza a técnica visando submeter e ultrapassar a natureza. O que inicialmente era corpo, passou a ser corpo e prótese, tornou-se corpo-prótese e agora se vê em vias de se tornar prótese e algum corpo, com a finalidade de ser apenas prótese. Neste sentido que tínhamos os instrumentos, depois as máquinas, os robôs, passamos a pensar no andróides, na engenharia genética, os ciborgues e a I.A. com singularidade.
Exemplificando, mas assumindo uma ausência de verificação. Em algum momento escutei que antes (século XVI-XVII) da revolução industrial, 90% da energia produtiva (isto é, que realizava algum trabalho) era humana; no início da revolução industrial este percentual caiu para 70% (por volta do século XVIII-XIX); e hoje estaria abaixo de 20% (século XXI).
O que me permite dizer que a decisão a ser tomada não é uma escolha entre esquerda x direita, marxismo x neoliberalismo, etc., mas entre monismo materialista que eclode como cientificismo tecnológico que fundamenta e estrutura todas as ordens política, econômica, cultural e social, e outras formas que fazem encontrar a transcendência (religiosidade e espiritualidade não materialistas) com a imanência tecno-científica. O resto é retórica de filósofos e sofistas.



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